Literatura, explicações e a Ilíada:
Desculpem-me pelo título um pouco inusitado, mas como eu prometi para mim que iria fazer um novo blog vou tentar esse novo modelo de numeração de vários assuntos, mas o post aqui apresentado irá listar uma série de leituras, filmes e algumas considerações sobre informações que fui acumulando esse semana. Ou seja, nada de diário pessoal, mas de leitura. Talvez, assim meu blog fique mais sóbrio e mais maduro como muitas coisas devem ser, embora, escrever com exageros, figuras linguagem super elaboradas e malabarismos literários seja muito interessante ao desenvolver um estilo próprio.
Nos últimos meses eu tenho lido um volume de clássicos muito grande e, muitas vezes, sim, eu me sinto enfastiado. São livros extremamente belos, mas eles são muitas vezes, sim, um tanto maçantes dependendo da recorrência e da temática. felizmente, em literatura Japonesa eu nunca sofri disso, mas mesmo a literatura Grega com seus poemas épicos (Ilíada e Odisseia por mais que sua grandiosidade seja enorme e a beleza seja absoluta eles não superam poetas mais líricos ou menos pomposos. Prefiro Hesíodo e Ovídio em questão de passar um tempo agradável, mas não há dúvidas da beleza superior da Ilíada, livro que estou lendo aos poucos, saboreando cada aspecto da obra com muito cuidado.
Para falar a verdade eu vejo quanto livros de literatura clássica ainda não li e fico meio desanimado de infiltrar nesse rol de títulos sabendo que eles são extremamente densos. O que acontece é que eu ainda não estou completamente disposto como antes a ler mais tanto, mas se eu não estou disposto a ler e nem a estudar o que me sobre é o trabalho e investir em novos projetos, mas mesmo assim pelo bem de manter este um hábito, afinal, sempre foi um hábito e não é agora que vou largá-lo resolvi manter um diário aqui com as coisas que estou lendo e assistindo.
Apesar do grande volume, a palavra calhamaço realmente faz jus ao tamanho do volume, especialmente quando se fala de um poema épico. Poucas pessoas tem fôlego para ler algo tão extenso, é uma obra muito deslocada do meu próprio senso estético e da ruptura romântica do ideal da poesia ou mesmo da confusão conceitual que as pessoa tem sobre poesia: poesia é lírica e amorosa ou canta as dores da alma de uma forma cândida, cheia de mel ou mesmo apenas canta trivialidades, as dores profundas do espírito são amenizadas e a poesia é breve ou cheia de rimas para nos proporcionar um espetáculo de sonoridade. Ela é muito mais forma que conteúdo e imaginar que personagens, situações e narrações são descritas de maneira objetiva e não apenas caracterizados com as palavras do escritor sobre um eu-lírico sejam as coisas colocadas para se ter o caldeirão da poesia. Uma poesia cantada em vários cantos, sem um eu-lírico é coisa vista no máximo nos Lusíadas, que duvido que tenham lido. Nem eu mesmo li os lusíadas e só pretendo ler depois de ler outros épicos. Imagine pessoas que não querem e nem gostam de poesia. (A maioria das pessoas não tem saco, afinal, nunca nos ensinaram a ler poesia e é um gênero pouco difundido, quase hermético). Ela é mais formal que significativa.
Dentro de todos os cantos que figuram nesta obra o que mais me marcou foi a jura de Aquiles e sua raiva contra Agamenon. Provavelmente eu e mais 90% dos leitores dos resumos ou versões integrais tem tal passagem como uma das mais belas, cheias de dor e, sim, narcisismo e orgulho exagerado, mas, mesmo assim extremamente belas e muito humanas. Nada dentro do sentido cristão de ser um bom cristão ou renunciar à sua glória ou acreditar em um brilhante futuro. (Dã) O que Aquiles quer é ser coroado como o maior dos heróis e se enfurece com Agamenon, o Atrida por ter negado os prêmios e as glórias próprias ao melhor dos Aqueus, que claro, é ninguém menos que Aquiles. Pode parecer um tanto absurdo essa falta de humildade, mas a dor e o sofrimento expressos pela mãe de Aquiles, a Ninfa Tétis, e mesmo o orgulho ferido de seu filho são acentuados pelo fato de que aquiles, segundo Tétis, n]ao viverá muito. “Tão curta vida” como diz na tradução que tenho em mãos.
A Ilíada é uma obra muito interessante, mas este formato épico, especialmente em uma linguagem tão refinada e versos brancos (sem rima) que tem um vocabulário repetitivo, mas bem erudito e as inúmeras situações de combate e descrições que são por vezes repetitivas podem tornar o livro fastidioso. Não sei se comentei, mas eu desisti de ler os quatro livros das mil e uma noites porque todas as histórias se pareciam e tinham conclusões diferentes e o método de encaixe de histórias por mais fantástico que pareça serve mais para a dispersão do impacto do conteúdo e a diluição das narrativas do que seu maior impacto. A Ilíada é repetitiva, mas eu sinto que como ela é uma literatura “manos popular” (Não posso afirmar com certeza, especialmente sobre poesia oral, mas que não é de cunho popular isso é fato. A contrário do que muitos pensaram no passado essas poesia não foi feita pelo espírito do povo. Muito provavelmente A mil e uma noites não pode ser dita como popular em si, mas o meu ponto aqui é o refinamento ou pelo menos o quanto cada obra me trás de prazer estético em retorno.)
Para falar a verdade é a falta de variação nas duas obras e a falta de uma boa colocação poética dentro dos termos escritos, afinal, tais obras foram compiladas de registros orais para os registros escritos e elas tem muitas marcas orais que precisam ser preservadas pelo bem da fidelidade da composição. Em suma: o formato de livro não é apropriado à esse tipo de literatura e como literatura é forma muitas vezes ler esse tipo de obra “oral” pode ser um tanto penoso.
Aqui vai uma imagem sobre o meu personagem favorito da Ilíada (A citação pelo menos é sobre ele):
A Ilíada por mais estranho que pareça é mais feita de imagens que de rimas, embora ela tenha uma sonoridade especial. Aliás a história para conseguir um exemplar desse livro que tivesse uma tradução satisfatória daria uma postagem inteira sobre a minha busca que incluiu mais de 4 edições (2 nacionais e 2 argentinas) cujas traduções não me satisfizeram por vários motivos. Sou bem chato com tradução. Isso porque uma das traduções foi feita pelo grandiosíssimo Haroldo de campos. Se você não conhece dê uma pesquisada. É um dos maiores críticos da literatura brasileira, poetas (do movimento concreto) e ESPECIALMENTE um dos tradutores mais renomados internacionalmente.
Acho que, por enquanto eu não tenho mais nada para comentar sobre a Ilíada, exceto que é a minha principal leitura nesse tempo. E os mangás? Você falou e falou de literatura clássica e nem ao menos era japonesa, nos deu uma palinha sobre mangás e prometeu que talvez falasse. Bem dito, pequeno gafanhoto, talvez, mas não se preocupem vou falar de Japão,sim, hoje aqui. Gostaria muito de comentar Kino no Tabi, mas vou deixar isso para uma próxima postagem. Sério mesmo, estou tirando férias de animes por tempo indeterminado.
Kenji Mizoguchi. Crisãntemos tardios:
Para falar a verdade esse movimento não é novo, mas em geral há pessoas que ainda estão descobrindo o Japão pop e outras, como eu, que são mais velhas e mais batidas pela busca incessante por novidades culturais sempre vão atrás de horizontes novos. Para falar a verdade eu tive pouco contato com essa cultura mais “refinada” ou pelo menos a cultura não associada aos animes. O que quer dizer um alívio para meus olhos cansados de ver uma cultura juvenil na minha frente. Por mais obras que sejam produzidas para públicos diversos mangás e HQs são destinadas à um público juvenil.
Desculpem-me colegas de blogs, mas por mais que eu respeite desenhistas e profissionais o público tradicional é infanto-juvenil ou se não é ele pode ser lido por jovens e adultos. Claro, existem HQs e mangás que não tem nada haver com isso, mas mesmo o melhor dos melhores é direcionado á um público mais jovem. Mesmo quando falamos de poesia ou alta literatura certos movimentos são considerados juvenis ou piegas como é, por exemplo, a poesia e grande parte da produção cultural do país. Uma generalização colocada por grandes estudioso da literatura brasileira que eu aplico ao caso aqui exposto.
De qualquer modo, tirando-se minhas longas leituras, posso dizer que assisti à um filme que foi largamente comentado por críticos e é considerado um dos 100 melhores filmes de todos os tempos: Ugetsu Monogatari de Kenji Mizoguchi. Na tradução do DVD que estou lendo a caixa consta que o filme “se chama” Contos da lua vaga. Essa pérola é um tanto difícil de descrever e eu não tive uma leitura cuidadosa do mesmo, portanto, não sei se estou apto a falar de um filme tão elogiado de um cineasta tão renomado, mas outro que conseguirei comentar apropriadamente se chama (na tradução) Crisântemos tardios e é considerado por muitos a maior obra do renomado diretor japonês. Infelizmente eu não tenho o DVD de crisântemos tardios e não encontrei nenhuma versão do DVD exceto na Europa em si.
Falando sobre o enredo de Crisântemos Tardios (e é um excelente enredo, por sinal, afinal, ele é exatamente uma peça grega, mas, ao meu ver bem ao modo japonês de ser). Um jovem artista é louvado pelo seu trabalho e vive uma fantasia de ser aclamado por todos, respeitado por aqueles que o cercam, mas todo esse respeito não passa de fachada, pois ele é filho do maior artista da cidade. Portanto, sua atuação embora péssima nunca foi questionada por servos, por mãe e nem pai. Ele não é um artista e não tem talento, na verdade o filme não fala de talento, mas de falta de dedicação e motivação. Até que uma das amas (babás), que é muito jovem, acaba tendo uma conversa muito sincera com ele e lhe diz que todos falam mal de seu trabalho e que ele deveria se dedicar melhor ao seu trabalho e se tornar um grande artista e que o sucesso dele não passa de fachada. Ele acaba se apaixonando por ela por ter sido a única sincera o bastante para lhe criticar, mas por conta de sua ação extremamente ousada e ambiciosa ela é afastada da casa onde trabalhava.
Atônito ele pergunta por ela e sua mãe lhe responde que ela foi afastada por ter se envolvido com ele. Preocupado e movido por uma paixão terrível ele vai atrás dela. Não a acha e depois de muito refletir sobre o vazio de sua carreira ele decide partir da cidade de Edo (não tenho certeza) e encontrar um tio que é um artista e viver sob sua proteção enquanto ele tenta desenvolver seu talento. Durante esse período (um ano) o tio dele acaba morrendo e ele reencontra a sua ama. Desesperados os artistas que atuavam naquele teatro por temerem não ter futuro resolvem se tornar um grupo itinerante.
Após muitas intempéries ele e sua amada acabam percorrendo durante muitos anos junto ao grupo itinerante atuando em condições sub-humanas e, por isso mesmo, o cândido e inocente garoto aristocrático que ele era se perde. Tal momento é expresso quando sua mulher lhe fala: você era um homem muito diferente e mudou tanto. Tal momento não tem nada de melodrama, mas de fato a queda do caráter, da ambição e do sonho e essa profunda crise pela qual ele passa.
Após isso eles recebem um letreiro de uma peça que está ocorrendo em Osaka (cidade onde eles estão) em que o grupo de seu pai vai atuar. Sua mulher insiste para que ele peça para poder atuar no grupo, mas ressentido e guardando receio de ser visto naquele estado ele proíbe sua mulher de fazer isso e diz que se recusa à ser visto naquele estado. Mesmo assim ela comunica os artistas da trupe para que lhe deem uma chance. Após isso ele acaba assumindo o papel de um dos artistas e atua magistralmente em uma das mais significativas peças da cidade e em um dos mais significativos papéis da peça ele retoma sua glória. Ao contar a novidade para sua esposa ele diz que ela poderá ir com ele de volta para sua casa com ele. Mero engano, já que ela é intimada a não ir com ele sem que ele saiba. Após isso ele retorna para casa sem sua esposa, muito chateado e até mesmo deprimido, mas sua vida segue, apesar de se sentir indignado.
Anos passam até que ele precisa retornar para Osaka (cidade que ele residiu muitos anos) para ser o ator que irá cegar e liderar um barco porque ele viveu muitos anos naquela cidade. No meio da comemoração ele é abordado pelo pai de sua noiva falando que sua mulher está morrendo em seu leito. Seu pai lhe diz que ele deveria ir atrás de sua mulher porque um artista, muito mais que a técnica é inspirado por alguém que seja importante para ele, o amor dele é verdadeiro, embora tenha sido negado. ao chegar lá ela fica feliz ao vê-lo, mas um pouco contrariada porque havia dado ordens para ninguém avisar ele sobre seu estado de saúde.
O fim como pode se esperar é a morte de sua amada quando ele está realizando a cerimônia. Isso é preludiado por uma bela cena de resignação onde os ois expressam todo o seu sofrimento enorme por não estarem juntos durante aquele tempo. infelizmente, a promessa é feita, mas não é cumprida. Ela suspira e pede para sua mãe lhe contar como foi a entrada de seu marido na cidade para o grupo de teatro. Note-se que não há closes, apenas a sugestão da mãe que ao dar um grito de espanto e dor sugere a morte dela. Aliás aspecto recorrente na obra dele é evidenciar a morte (pelo menos dois filmes, incluindo esse e Ugestsu monogatari trabalham a morte dessa maneira). portanto, é sugestivo, mas não escancarado.
Acho que fico por aqui e só recomendo algumas músicas japonesas da artista Meiko Kaji que teve uma de suas música colocadas na trilha sonora de Kill Bill:
*-* gostei muito Amidamaru…quando der eu vou ver esses 2 filmes(pelo que eu vi são beeeem antigos XDmas irei assistir)
Qual versão da Ilíada você leu? Pessoalmente, gosto da tradução de Haroldo de Campos. Achei ela bem menos cansativa que as outras com que me deparei.
De todo modo, concordo que a poesia homérica não é de fácil leitura para ninguém. Na verdade, ela chega até a ser um tanto… estranha quando olhada por um ângulo mais realista (uma amiga minha sempre me faz rir quando remonta cenas da Ilíada sem toda a pompa do hexâmetro).
Mas dos dois grandes épicos de Homero, sempre achei a Odisséia mais interessante pela sua importância no desenvolvimento da literatura de formação e na criação do modelo do herói inteligente. Por mais que a saga da fúria da Aquiles seja mais trágica, não consigo deixar de ver a Odisséia como uma obra mais relevante para o contexto moderno, especialmente o da literatura latino-americano. De certo modo, o herói latino me parece sempre uma espécie de Odisseu (Coronel Aureliano Buendía e Horácio Oliveira me vêm a mente). Ou talvez isso seja algo do próprio homem moderno.
A Odisseia em si diz mais respeito ao homem moderno, mas inegavelmente a Ilíada tbm mais valor poético do ponto de vista formal e tradicional. Estou lendo a versão da Companhia da Letras. Uma ótima versão, mas o que me intriga na versão do Haroldo de Campos é a sua falta de comedimento em botar neologismos. Sobre certas passagens de Homero por mais que sejam pouco realistas isso não constitui uma crítica válida pelo fato de que a visão dem undo, o contexto em si e mesmo a natureza do significado que dão essa cor. Muitas obras modernas super-realistas não tem a mesma força poética e por mais que o exagero das peças poéticas dele possa ser destacado isso constituí , ao meu ver, mais uma falta de senso estético do que uma brincadeira saudável. Não sei, mas esse tipo de citação é formulada por quem não gosta do conteúdo ou gostaria de pelo menos tirar a validade do conteúdo da obra transformando ela apenas em casca. Meio mesquinho, mas okay. Obrigado pelo comentário.
Não discordo desse ponto. Shakespeare é bastante similar nesse sentido (a morte de Polônio, por exemplo). É só que é até engraçado ver como o ideal estético era absolutamente diferente do que se faz atualmente ou mesmo do que se fez pouco depois, como na Divina Comédia ou mesmo na Eneida. É estranho olhar, mas a épica, e mesmo alguns dramas, gregos parecem extremamente alienígenas mesmo quando olhados dentro do contexto. Sempre acabo me lembrando do caso das das versões de Euripedes e Ésquilo da guerra de Tebas e do caso das Electras. Mesmo naquela época parecia haver uma noção forte de realismo e surrealismo.
Sobre a versão do do Haroldo de Campos, tem-se que lembrar que ele mesmo era um poeta, então há certa carga do estilo pessoal nas traduções dele.
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